Doutora e especialista em odontogeriatria, Denise Tibério fala sobre a saúde bucal do idoso
A longevidade é uma condição esperada por todos nós. Mas, para isso, é necessário estar com a saúde em dia. Inevitavelmente, com o processo de envelhecimento, os pacientes da terceira idade acabam desenvolvendo algumas fragilidades, como a diminuição salivar. Então, é preciso também estar atento à saúde bucal do idoso.
Desde 2014, a população brasileira com 65 anos de idade ou mais aumentou cerca de 26%. Segundo o Ministério da Saúde, o país terá a quinta população mais idosa do mundo em 11 anos. Esse crescimento cada vez mais relevante sinaliza a necessidade de conhecer e se preocupar com a saúde bucal do idoso.
A saúde bucal do idoso exige atenção para algumas particularidades do envelhecimento. Na terceira idade, é comum que hajam algumas alterações no ambiente bucal, bem como maior vulnerabilidade a doenças orais.
Por que a saúde bucal na terceira idade é mais vulnerável?
Os aspectos citados anteriormente acontecem por vários fatores relacionados ao processo de envelhecimento, como a redução das defesas do sistema imunológico no combate aos microrganismos orais e a falta de destreza manual para realizar uma escovação eficiente.
Estima-se que o paciente idoso é um dos mais acometidos pelas doenças periodontais, sendo a gengivite a patologia crônica com mais incidência entre os idosos dentados. Esse fator está diretamente relacionado ao envelhecimento das células do periodonto, tornando a cicatrização mais lenta.
Por falar em dentição, cerca de 41,5% dos brasileiros com mais de 60 anos convivem com a perda total ou parcial dos dentes. Esse fator pode ter impacto na qualidade de vida, especialmente quando há utilização inadequada de próteses, capaz de gerar desconforto psicológico e até dor.
Todos esses aspectos revelam a importância dos cuidados com a saúde bucal do idoso.
Para falar sobre o assunto com mais propriedade, entrevistamos Denise Tibério, formada em odontologia pela Unesp e doutora em Ciências da Saúde e especialista em periodontia e odontogeriatria pela Unifesp.
Quanto ao uso da prótese por pacientes idosos, Tibério explica que a higiene completa é fundamental para evitar a proliferação de bactérias:
“Segundo o IBGE, 75% dos idosos usam prótese dentária. É importante tirar as próteses, higienizá-las e lembrar de escovar os dentes e limpar a mucosa, no caso de dentaduras. As próteses são elaboradas com materiais porosos, onde bactérias e fungos formam colônias e, consequentemente, levam a lesões na cavidade bucal, principalmente se o fluxo salivar está diminuído.”
Outras alterações bucais comuns na terceira idade
Além dos problemas bucais que já citamos, a terceira idade também propicia outros problemas, como:
- Dentes mais rígidos, facilitando fratura dentária e lesões na mucosa que podem passas despercebidas pelo idoso;
- Mucosa da boca mais friável, isto é, mais suscetível a sofrer esfacelamento;
- Perda de tonicidade da língua e sensibilidade gustativa, bem como diminuição de outros órgãos sensoriais;
- Cárie, uma vez que a diminuição dos órgãos sensoriais faz com que a higiene fique deficiente;
- Diminuição do fluxo salivar.
Quais cuidados com a saúde bucal devem ser observados na terceira idade?
Os problemas bucais e a fragilidade na saúde, como você já sabe, impactam na qualidade de vida do idoso. É comum observarmos reflexos disso na fala, na alimentação e até mesmo na autoestima.
Desse modo, os cuidados tomados com a saúde bucal devem ser especiais. De acordo com a Dra. Denise Tibério, na rotina de higiene oral na terceira idade, por exemplo, pode ser que o paciente precise de escovas e cremes dentais específicos para garantir uma escovação eficaz.
Também é comum que nessa idade os pacientes usem medicamentos. Para Tibério, essa prática pode ser prejudicial à saúde bucal, especialmente se o medicamento reduzir o fluxo da saliva.
“A saliva é uma secreção muito importante, pois ajuda na formação do bolo alimentar, possui anticorpos, inicia a digestão de amido, neutraliza ácidos e umedece com uma camada fina toda a mucosa e os dentes, protegendo-os”, explica a doutora.
Ela ainda dá dicas para estimular a formação de saliva na boca: “Há estudos que exibem que se mastigarmos ao menos 30 vezes, aumentaremos o fluxo salivar, desde que tenhamos bebido 2,5 litros de água ao dia”.
Quando a medicação é administrada com alimentos açucarados, como chás ou sucos, a higiene bucal durante o dia precisa ser intensificada.
Fora esses cuidados, as consultas de rotina com o odontogeriatra merecem atenção especial, já que verificam a presença de lesões indolores e controlam a higiene. Assim, previvem o surgimento de doenças orais e realizam a manutenção da saúde bucal na terceira idade.
Por que o paciente idoso deve consultar um odontogeriatra?
Apesar do dentista sem especialização estar apto para o atendimento de qualquer paciente, independente da faixa etária, o ideal é que o paciente idoso receba assistência odontológica do odontogeriatra.
Tibério esclarece que o odontogeriatra é um profissional capacitado especialmente para o tratamento odontológico do idoso porque tem conhecimento das doenças prevalentes nessa idade
“Além de ter uma visão interdisciplinar e gerontológica, visualizando o idoso no espaço bio, psíquico e social e promovendo a saúde e a dignidade, o odontogeriatra também tem conhecimento em polifarmácia, suas repercussões na cavidade bucal e sua interação com medicamentos de uso odontológico”, conta.
Uma vez que a população idosa é heterogênea, não existe um protocolo definido no sentido de visitas periódicas, Ou seja, se é uma vez ao mês, uma vez a cada dois meses, etc.
Por essa razão, a assistência odontológica na terceira idade e sua periodicidade dependem da capacidade de autocuidado do paciente.
Mesmo assim, a doutora alerta: “É prudente uma visita constante [ao odontogeriatra], pois o envelhecimento acontece lentamente, sem que o indivíduo perceba o comprometimento gradativo dos órgãos sensoriais, podendo comprometer a saúde bucal”.
Voltando nosso olhar para o lado profissional, os dados podem ser preocupantes.
De acordo com o Conselho Federal de Odontologia (CFO), em âmbito nacional, dentre os 328 mil cirurgiões-dentistas com inscrição ativa nos conselhos odontológicos, apenas 275 são especialistas em odontotogeriatria.
Se isso for comparado aos dados de crescimento da população idosa, observa-se que há uma alta demanda por profissionais da área.
Portanto, o setor odontológico e, mais especificamente, a odontogeratria, deverão estar preparados para atender e tratar a saúde bucal do idoso, principalmente quando o número de idosos for ainda maior.